Nos seis anos da LGPD, conselheiro do CNMP destaca que o Brasil possui uma norma preocupada em proteger um direito fundamental do cidadão: os dados pessoais

22/08/2024

Nesta quarta-feira, 14 de agosto, a Lei nº 13.709/2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados, completa seis anos. Em entrevista à Secretaria de Comunicação Social do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o conselheiro Fernando Comin (foto) afirma que, a partir da edição da lei, “o Brasil passou a ter uma norma geral, semelhante à europeia, preocupada em proteger um direito fundamental do cidadão brasileiro – que perpassa bens jurídicos como a intimidade, a privacidade, a dignidade e a humanidade -, que são os dados pessoais”. 

Comin exerce, também, os cargos de presidente da Comissão de Preservação da Autonomia do Ministério Público (CPAMP) e da Unidade de Proteção de Dados Pessoais (UEPDAP), criada, recentemente, para dar concretude à função do CNMP como Autoridade Nacional de Proteção de Dados do Ministério Público.

Com base nessa experiência, o conselheiro afirma que a LGPD deve ser comemorada e bem aplicada, havendo a necessidade de que seja efetivamente compreendida por todos – controladores, operadores e titulares dos direitos pessoais. 

Além disso, o conselheiro aborda a importância da lei para o CNMP e para o MP, e os desafios que devem enfrentar para se adequarem à LGPD. Comin chama a atenção, também, para a atribuição do Conselho no aprimoramento da atuação do MP na proteção dos dados pessoais e destaca a importância da Resolução nº 281/2023, que instituiu a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e o Sistema Nacional de Proteção de Dados Pessoais no Ministério Público. 

Leia os principais trechos da entrevista:

Conselheiro Fernando Comin, o que destacar nos seis anos da Lei Geral de Proteção de Dados?  

A partir da LGPD, o Brasil passou a ter uma norma geral, semelhante à europeia, preocupada em proteger um direito fundamental do cidadão brasileiro – que perpassa bens jurídicos como a intimidade, a privacidade, a dignidade e a humanidade -, que são os dados pessoais. Como ao Ministério Público foi dada a importante missão, na Constituição Federal, de ser um dos principais atores responsáveis pela proteção desses direitos fundamentais, a LGPD passou a ser um verdadeiro instrumento de ação e de firme atuação institucional, a ponto de o CNMP criar uma estrutura nacional de apoio, implementação e fiscalização da proteção dos dados pessoais, interna e externamente falando. Sem dúvida, uma lei importante que precisa ser comemorada e bem aplicada.

Quais os avanços da LGPD? 

Além de ela permitir a celebração de acordos e negócios comerciais entre os países que se preocupam com a proteção de dados pessoais, sendo essa a razão inicial que levou à aprovação no Brasil, hoje em dia, a LGPD já está sendo vista como uma legislação que irá proteger o cidadão em relação aos avanços tecnológicos e abusos daí decorrentes. É claro que a inovação é necessária e benéfica, todavia, ela não pode acontecer sem respeitar direitos e sem a devida proteção dos dados pessoais. Precisam atuar juntos. Nesse sentido, temos um avanço legislativo de proteção.

O que precisa ser melhorado/ajustado na LGPD? 

É necessário que a LGPD seja efetivamente compreendida por todos, tanto pelos controladores e operadores – que são aqueles que colhem, usam, tratam e legalmente se aproveitam dos dados pessoais -, como pelos titulares – que são os donos dos dados pessoais e muitas vezes não sabem disso. Há de se melhorar essa relação, o conhecimento da lei e da proteção inerente, que atualmente tem patamar constitucional. Há de se melhorar a cultura sobre a proteção de dados pessoais. E, claro, a partir da prática e da aplicação da LGPD, talvez sejam necessários ajustes e atualizações, principalmente de interpretação.

Qual a importância da LGPD para o CNMP e para o MP? 

Tratando-se a proteção de dados pessoais um direito fundamental, constitucional, do cidadão, o MP brasileiro precisa se debruçar sobre a lei e sobre as melhores formas de colocar essa proteção em prática. Para o CNMP, ela ensejou uma importante e inédita regulamentação, a Resolução CNMP nº 281/2023, que trata de muitos e importantes aspectos práticos, tecnológicos, jurídicos e de gestão desse tema no dia a dia da instituição. Tem importância muito grande para todos nós, como atores de proteção e como cidadãos.

Quais os desafios do CNMP e do MP para se adequarem à LGPD? 

Os desafios são grandes, como toda novidade impõe. Passa pela mudança total da cultura, da fiscalização e da orientação a respeito do direito fundamental à proteção de dados pessoais. Com a conformidade interna, de todos os ramos e unidades, seus órgãos, seções, gerências, diretorias, com mapeamento de dados, avaliação e estudo de riscos, regras de compartilhamento, entre outros, e com a conformidade externa e tão importante quanto, no sentido de proteger o direito fundamental na atividade finalística da instituição. 

A partir da LGPD e do artigo 5º, LXXIX, da Constituição Federal, no mesmo patamar da liberdade, do patrimônio, da moralidade e do meio ambiente, por exemplo, temos que estar preparados para defender o direito fundamental da proteção de dados pessoais. Vale tanto quanto os outros direitos fundamentais. E, aqui, aliás, temos um desafio a mais: infelizmente, o titular desse direito fundamental, muitas vezes, não sabe que ele existe e que ele é valioso. Daí é que a missão e a responsabilidade do MP se sobressaem, pois se trata de proteger alguém que está vulnerável, em maior risco.  

Qual o papel do CNMP e do MP na proteção de dados pessoais, incluída na Constituição Federal entre os direitos e garantias fundamentais? 

É muito grande, desafiador e importante. Difícil, mas o MP brasileiro já está dando passos largos nesse sentido, fazendo espraiar nos seus ramos e unidades a cultura de proteção de dados pessoais. 

O que o CNMP tem feito para orientar e aprimorar a atuação do MP na proteção dos dados pessoais? 

Recentemente, o CNMP instalou a Unidade de Proteção de Dados Pessoais (UEPDAP), que tem, entre inúmeras atribuições, incentivar a capacitação de membros e servidores, além da sociedade em geral, acerca desse tema agora de status constitucional. É uma importante estrutura de fortalecimento da cultura de proteção de dados pessoais no MP brasileiro e de interlocução interna e externa do CNMP para a efetiva tutela dos direitos a ela inerentes.

Quais pontos da Resolução CNMP nº 281/2023 o Sr. considera mais relevantes? 

O ineditismo e a envergadura. Trata-se de uma regulamentação sólida, bem-feita, influenciada pelo que se faz e se aplica de mais moderno no continente europeu, onde o tema já é tratado há pelo menos 40 anos. Com 173 artigos, a Resolução CNMP nº 281/2023 se apresenta, na verdade, como um verdadeiro código, de viés protetivo, mas ao mesmo tempo orientativo e até fiscalizatório aos ramos e unidades, aos membros e servidores e, até, aos terceiros que interagem com a instituição. Uma referência que, aos poucos, está sendo implementada e que irá permitir fazer um diagnóstico nacional de conformidade do MP, assim como de um cronograma nacional padronizado de implementação de princípios, regras e ações organizadas em prol desse “novo petróleo”, como esse direito vem sendo visto no mundo.   

Fonte: cnmp

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